- Como obséquio de minha escravidão por amor -

27 de novembro de 2015

Vida da Virgem no Templo

A glória sem véu



Porém, aos olhos do Pai Celeste, ela refulge
     em todo o seu brilho
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e inunda de resplendores as moradas etéreas.
Quando mais te envileces, tanto mais te sublimas
ao conspeto daquele que deseja para leito
     o teu materno seio.
Em breve ele te descobrirá
     nesse ínfimo posto.
E Ele fará soar aos teus ouvidos
     este doce convite:
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"Eia, sobe mais acima amada minha!"
vem assentar-te no primeiro posto,
     que tanto mereceste!
Núncia de tanta felicidade, há de chegar
essa hora, a ti feliz, a nós auspiciosa.
No momento em que menos o julgares,
     Virgem humílima,
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virá dizer-te o "Ave" de mãe excelsa de Deus.
     eia pois, vive por nós!
pois tu nos hás de dar a vida e a luz:
vive, que está próximo este dia feliz!
E a mim, o mais pobrezinho de teus servos,
     orna-me com tua humildade,
sem a qual, nem a ti nem ao Senhor agradarei.
Este virtude me há de adornar o coração
     e há de preparar nele,
     para o menino, um berço
e, para a mãe, morada hospitaleira!
     Oh! Quem me dera ser digno
de um olhar dos olhos meigos da Senhora
e ser, muito embora, o último entre seus servos!

17 de novembro de 2015

Vida da Virgem no Templo

A glória da humildade



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     Mas, que sonho eu, estulto?...
tu desdenhas o fausto e do coração amante fazes
     o escrínio da humildade.
Gozas em ser a menor, em obedecer a todas:
fora disso, nada no mundo é grande, em teu conceito.
Sabes que Deus derriba os soberbos de seus tronos
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e aos humildes exalta do monturo.
Ainda que nada ignores, sofres que te ensinem
obedecer, ser desprezada, ser corrigida
     eis a tua felicidade.
Por isso, sepultas no fundo do peito
teus régios segredos e disfarças
o ardor divino que se expande no teu rosto.
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mas não o consegues, pois dificilmente
     se encobre o fogo:
a luz da labareda transpira pelas frestas
É divino e resplendor que brilha em tuas faces:
     tuas palavras o calam,
tuas obras o proclamam às companheiras.
     Elas em seus colóquios
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afirmam que és santa e feliz mais que todas.
Cravando em teus olhos os seus cheios de afeto,
que manso espelho de bondade fitam!
     conversar-te é um prazer,
um prazer contemplar o teu semblante:
chamam-te sua rainha e sua maior glória!
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Tu, entretanto, julgas-te indigna de tanta honra
e até ao excesso te envileces a teus olhos.
     De dia para dia,
vais adornando de novas virtudes tua alma,
o verdadeiro templo e tabernáculo de Deus.
Modelo de castidade e níveo pudor
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é o teu corpo, do qual há de brotar
o nobre corpo, unido à divindade.
Apesar desta torrente transbordante
     que te inunda a alma,
vives persuadida de que teu coração é um vazio!
Sendo, por graça, a mais sublime das criaturas,
julgas que, de justiça, só o último lugar te cabe.
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É tanta a graça que estua a tua alma,
e tão bem te cerras ao fundo do peito as labaredas!
Ou é o véu da soberba que nos vela os sentidos
e nos torna cegos diante de sol tão fúlgido!

16 de novembro de 2015

Vida da Virgem no Templo

A atração do bem



Mau grado meu, sinto que uma força me arrasta
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a contemplar os deslumbrantes clarões de tua vida.
Quando raia a manhã trazendo a pós si o novo dia
oh! como deixas o amplexo e os ósculos divinos!
     De novo tua mão
corre ao duro trabalho, pressurosa,
e os dedos arrebatam o fuso sequiosos
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Rodeiam-te as outras virgens, tuas irmãs,
     a tecer também seus fios,
ávida cada qual de vencer sua meada.
Põe os olhos em ti de admiradas,
     ao ver sem inveja
que a destreza de tuas mãos a todas excede.
     Mas, não te deixas vencer:
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Em tua sublime modéstia vais buscar
     o último lugar.
Prestar humildes serviços às donzelas consagradas
eis a tua preocupação,
a tua tua glória mais ambicionada.
Tu lhes limpas com humildade as vestes
estendes as camas e, serva obsequiosa,
     guisas os manjares:
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Varres alegre a casa e lavas a louça:
     lanças a tua conta
quanto de abjeto há de fazer no santuário:
     se a doença feres a alguma,
tornaste medicina, palavra confortadora,
doce obséquio, auxílio pronto a tudo.
Mas, die-me, que ideal te inflama, ó Virgem,
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nesse ofício tão baixo, nesse ofício de escrava?
Talvez ignoras que um dia, soberana do céu,
hás de ter aos pés todo o universo?
     Deixa aos servos o servir:
a seda, a púrpura, o império, o trono, o cetro, a coroa
     eis o teu apanágio!

6 de novembro de 2015

Vida da Virgem no Templo

O deslumbramento do poeta



     Projetara percorrer
os numerosos passos da tua existência
para traçar por ela caminho reto à minha:
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     mas, eis-e distanciado
pelo número e valor de tuas virtudes:
o meu espírito, cheio de avidez, desfalece,
ante perfeições tão sublimes, esgotado!
Ainda que muitas princesas reúnam
     suas prendas inúmeras,
seu domínios e bens de toda espécie,
tu ergues sobre todas a fronte de rainha:
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nem todas em globo são capazes de atingir
     a grandeza de teus tesouros.
São inúmeros os latifúndios de teu coração:
recebeu inumeráveis e contínuas riquezas
     e não se abarrotam.
Teu corpo imaculado está cingido
     de casta robustez:
tua face é espelho a refletir as leis do céu.
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     Bem é que assim refulja
quem de Deus há de ser altar e templo,
a quem nem a terra, nem o mar, nem o espaço
     podem abarcar.
     Ah! Senhora, eu pasmo
ante tua grandeza fulminado:
tu, futura mãe daquele que é teu eterno Pai!
Tua glória se levanta a tais alturas, que, vencido,
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me faz morrer nos lábios o teu canto.
Atado a teu colar, preso nos grilhões desse amor,
a mim basta-me jazer eternamente a teus pés.
Já que, depois de muito esperar por mim,
me arrebataste, na luz do teu olhar bondoso,
     para o templo de Deus,
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e quiseste ajuntar-me aos companheiros
     de meu Senhor Jesus,
e sofres que viva em tua santa morada:
aqui, aqui p'ra sempre me acalente tua bondade,
e teu braço me afaste da ruína
     com o laço tríplice dos votos.